Como você tem passado? Quantos amigos tem ou quantos fez pelo caminho?
Outro dia eu lia no Facebook o comentário de alguém revoltado por algumas pessoas terem atingido o limite de 5.000 amigos. O que essa pessoa talvez não tenha entendido é que você poderia classificá-los de muitas formas, dizendo inclusive que eram apenas conhecidos.
Conhecidos? Deixa eu voltar no tempo, uns 15 anos… uns, porque eu não lembro exatamente o ano e data, mas acredito que a imprecisão seja válida neste caso, dado nossos futuros a partir daquela noite agradável, divertida e que iria transformar minha vida pelos próximos anos e nos que ainda estão por vir.
Eu tinha acabado de sair de um relacionamento doentio, estava reconectando a minha vida, e naquelas de não querer reiniciar sozinho, convidei um conhecido para sairmos. Sem pretensão nenhuma, só companhia mesmo. E assim o foi. Não lembro como ele terminou a noite, e também não lembro de vê-lo nos anos que se seguiram, mas as duas pessoas que eu conheci naquela noite, ah, essas duas continuam na minha vida, e participaram de um bocado de coisas dela.
Estávamos ali, em frente à boate, você podia entrar e sair, e ficar ali na frente conversando ou até mesmo atravessar a rua para ir na loja de conveniência do posto. E naquele espaço, sentados no degrau (a boate tinha dois ambientes, e externamente eles eram bem distintos, um deles era uma casa, de construção antiga, com uma área na frente, e dois ou três degraus separavam o nível da rua da porta de entrada, e eles estavam ali), os dois conversavam com um terceiro, um outro conhecido que a exemplo do meu companheiro da festa, nunca mais tivemos notícias.
Naquela noite achei que eram pessoas interessantes, e que acabava aí. Os vi dançar, conheci seus amigos, e festa após festa, fomos nos aproximando. Pela conveniência da companhia, pelas paixões platônicas que surgiam no grande grupo, pelo itinerário da minha casa até a boate, pela conveniência também da minha carteira de motorista e do carro do meu pai. Naquela noite em que nos conhecemos, um deles voltou de carona comigo. A casa dele ficavam no caminho; entre a minha cidade (Gravataí) e Porto Alegre, tem uma cidade chamada Cachoeirinha, ele morava lá.
No caminho de volta, ele foi conversando (ou monologando), até chegarmos. Acho que naquela viagem de carro, o fato de ele ser tão transparente, tão direto, fez com que os anos que vieram fossem tão intensos. Fui conhecendo os dois, um morando em Cachoeirinha, outro em Porto Alegre. E logo, logo nos tornamos parceiros na noite, cúmplices na internet e vítimas de uma amizade que se estende há anos.
Eles tem uma afinidade com a qual não dá para competir?—?um pouco por escolha minha, como tu sabes, querido diário, eu sou de me esconder na minha concha vez que outra?—?uma forma de ver a vida que se mistura e se separa, um complemento que se completa e descompleta. Tenho um carinho imenso pelos dois.
E o que eu me dei conta, nesse sábado, é que a amizade é como aquela árvore que nasce selvagem no nosso terreno e se não cortarmos ela vai crescendo e crescendo. Essa nunca criou raízes que destruíssem a calçada, mas já passou por ventos fortes que fez com que alguns galhos arrancassem o telhado.
No sábado, fomos a festa de despedida do meu querido ex-morador da Cachoeirinha, ele vai se mudar a trabalho para fora do país. Vai de mala, cuia e tudo mais. Sem data de retorno ou sem dúvidas de ficar. E meus olhos sangraram lágrimas, algumas leves e outras mais pesadas. Passei na minha cabeça os dias em que o conheci. Às vezes que almoçamos juntos no intervalo do trabalho, caminhávamos 3 ou quatro quadras para termos 50 minutos juntos na praça de alimentação do shopping.
Eu lamento por algumas coisas, sim, mas não lamento nossa amizade. Nesses anos que passaram, eu me mudei de cidade, mudei de vida, de emprego, de profissão, ficamos sem nos ver, os três, às vezes por 3 ou 4 meses, às vezes por um ano. Só que cada reencontro sempre foi como se o tempo estivesse congelado. Existe uma marca na minha alma, em algum lugar, que tem o nome dos dois, marcado a fogo, gelo, ar, terra, todos os elementos. Feita de uma forma indissociável. Teus olhos não podem ver agora, mas essas últimas linhas trouxeram de novo as lágrimas aos meus olhos. Pelas vezes que esqueci de pedir ajuda, pelas vezes que fiquei na minha concha e não os deixei participar.
Fui buscar meu autoconhecimento de uma forma tão profunda nos últimos anos que em parte esqueci as histórias as quais compõem quem eu sou. Dizer até logo para uma dessas histórias me fez reviver tudo. Como se uma pílula me devolvesse imagens que eu acreditava esquecidas.
Com esse momento, lembrei de outros, e também de outras amizades próximas e distantes, de pessoas que escolheram achar minha companhia agradável, e que eu preciso estar mais próximo, por mais difícil que sair da minha mente, algumas vezes, seja.
Fico feliz por ter começado esse diário, desde que o fotolog caiu em desgraça, que não gero rastro de forma tão recorrente. Isso me faz dialogar com meu self, com meu Deus interior.
Voltando aos dois. E talvez devesse escrever cada uma das histórias separado, talvez, mas daria mais trabalho, pois as histórias se confundem. Nas vezes em que um dos dois não esteve presente, sempre havia a presença da lembrança, da intenção. Foi assim quando meu amigo de Porto Alegre foi morar em São Paulo. Foi assim quando fomos acampar sem nenhum rastro ou sinal no GPS de Cachoeirinha. Foi assim quando vieram me visitar separados aqui em Caxias. Nós três temos nossos amores, nossas vidas, nossas carreiras, nossos futuros, mas eu tenho um carinho, uma admiração pelos dois que é gigante e silenciosa.
Por isso, querido diário, não deixe que os quilômetros a mais nos separem dessa vez. Me lembre sempre disso.
— Sama, te desejo todo o sucesso do mundo! Sei que este momento te enche de felicidade, de esperança e principalmente de orgulho. Te desejo um feliz aniversário, que tu possas comemorar em mil idiomas, aqui e lá. Que no teu próximo aniversário esse sentimento continue o mesmo, e que quando tiveres um tempo, ou de bobeira, manda um whats.
— Rafa, que esse ano 1 (2+0+1+7), possa nos aproximar mais novamente, que nossas trocas sejam como eram no começo. Principalmente agora, que os quilômetros mais uma vez nos separam os três.
Se alguém chegou aqui por acaso nessas linhas, esse é um registro de formação, da amizade, do carinho. De uma reflexão que me traz a certeza de que somos feitos pelas pessoas que admiramos, e que amo meus amigos e principalmente o reflexo deles que vejo em mim. Me lembra querido diário, que as coisas do mundo nem sempre são efêmeras, que a amizade sincera existe e que a gente só está sozinho, quando decide estar.
Aos meus dois amados amigos, que são tão diferentes, e ao mesmo tempo ocupam lugares milimetricamente iguais no meu coração, na fila da frente desse espetáculo que é a vida. E para quem se pergunta se os números importam, eu digo que não, pois muitos são os que encontramos, mas poucos são os protagonistas de cada um dos capítulos da nossa história.